20 de fev. de 2025
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Gabriel Nunes
No mundo do desenvolvimento de software, muito se fala sobre a importância de escrever código limpo, eficiente e escalável. No entanto, há um fator que muitas vezes é negligenciado: a compreensão do negócio. É aqui que entra o conceito de Product Engineer, um profissional que, além de desenvolver software, tem um olhar atento para o impacto do seu trabalho no produto e na empresa como um todo.
Mas o que exatamente faz um Product Engineer e como essa mentalidade pode beneficiar qualquer pessoa desenvolvedora? Para responder a essas perguntas, conversamos com Lucas Faria, Product Engineer na PostHog.
O que diferencia um Product Engineer de um Software Engineer?
Na teoria, ambos fazem a mesma coisa: criam softwares para facilitar a vida das pessoas. No entanto, o Product Engineer se aproxima mais das funções tradicionalmente atribuídas a um Product Manager, como pesquisa de mercado, planejamento de roadmap, suporte ao usuário e análise de dados.
A principal diferença está na abordagem ao desenvolvimento de software. Enquanto um Software Engineer tradicional foca mais na implementação técnica, o Product Engineer precisa equilibrar a engenharia com a visão estratégica do produto. Isso exige um pensamento mais holístico e uma colaboração maior com outras áreas, como design e negócios.
“Os usuários, na maioria das vezes, não se importam com como o software foi feito. Eles querem que resolva o problema. Se você for conhecido como uma pessoa que resolve problemas, independentemente da tecnologia, isso te torna um profissional mais capacitado e com mais opções de carreira”, explica Lucas. Esse foco na entrega de valor faz com que Product Engineers tenham uma perspectiva mais ampla sobre o impacto das decisões técnicas no sucesso do produto e na experiência do usuário.
A importância da mentalidade de negócio
Muitas pessoas desenvolvedoras focam exclusivamente no código e na arquitetura do software, mas a verdade é que a tecnologia é apenas um meio para um fim maior: resolver problemas reais. Ter uma mentalidade de negócio significa entender como a empresa gera receita, quais são os desafios enfrentados pelos usuários e como o produto pode ser melhorado para atender às necessidades do mercado.
Ter essa visão permite que o profissional tome decisões mais estratégicas, priorizando o que realmente gera valor para a empresa e para os clientes. Essa abordagem evita desperdício de tempo e recursos em funcionalidades que não impactam o negócio de forma significativa.
Além disso, uma pessoa desenvolvedora com essa mentalidade consegue antecipar problemas antes que eles aconteçam, colaborando ativamente para que a equipe esteja sempre alinhada com os objetivos estratégicos da empresa. Isso não apenas melhora a eficiência do desenvolvimento, mas também fortalece o relacionamento entre times técnicos e de negócios.
Quando a falta de visão de produto prejudica um projeto
Para ilustrar a importância dessa mentalidade, Lucas Faria compartilhou um exemplo real de um projeto em que a falta de compreensão do negócio impactou negativamente o resultado:
“Quando estava fazendo um processo de refatoração nas permissões do produto que trabalhei na Brex, o Bill Pay (BP), não tive muito contato com os clientes que usavam o BP. Por conta disso, quando terminamos a primeira versão dessa feature, havia muitos casos faltando que nenhum engenheiro na equipe conseguiu prever. Exatamente por falta de conhecimento sobre como o produto era usado em todos os casos possíveis. Isso atrasou a entrega em algumas semanas, algo que, se tivéssemos um entendimento melhor no começo, teria sido muito melhor planejado.”
Projetos que ignoram o impacto real no usuário e no negócio correm grandes riscos de atrasos, retrabalho e falhas. Uma pessoa desenvolvedora que compreende o funcionamento do produto como um todo evita esses problemas e entrega soluções mais eficazes.
Erros desse tipo não apenas aumentam o tempo e os custos de desenvolvimento, mas também podem afetar negativamente a percepção do usuário sobre o produto. Em mercados competitivos, cada detalhe importa, e uma funcionalidade mal planejada pode ser a diferença entre a fidelização e a perda de um cliente.
Habilidades essenciais para uma pessoa desenvolvedora com visão de negócio
Para adotar uma mentalidade de negócios, algumas habilidades são essenciais:
- Saber conversar com clientes e fazer entrevistas de usuários: mesmo para pessoas desenvolvedoras introvertidas, essa é uma habilidade que pode ser treinada.
- Entender como a empresa gera receita: compreender o modelo de negócios ajuda a tomar decisões mais estratégicas.
- Participar de rotações de suporte: ver onde os usuários estão enfrentando dificuldades no produto pode trazer insights valiosos.
- Saber medir o impacto do trabalho: é fundamental analisar se um produto ou feature está tendo sucesso e entender seus efeitos no negócio.
- Construir relacionamentos internos: se não houver acesso direto aos clientes, manter contato com equipes de vendas, suporte e design pode ser uma alternativa.
Essas habilidades não só ampliam a visão do desenvolvedor, mas também o tornam um profissional mais valorizado dentro da empresa. Quanto mais um engenheiro se envolve com as necessidades do negócio, mais ele contribui para o sucesso do produto e da organização.
Além disso, uma pessoa desenvolvedora que domina essas habilidades se torna um profissional mais versátil e preparado para crescer dentro da empresa, podendo até mesmo migrar para cargos de liderança ou gestão de produto, caso tenha interesse.
O desafio da comunicação
Um dos maiores desafios para pessoas desenvolvedoras ao adotar essa visão mais ampla é a comunicação. Muitas vezes, ao discutir problemas e soluções com equipes não técnicas, é fácil cair na armadilha de usar uma linguagem excessivamente técnica.
Para evitar isso, é essencial desenvolver a habilidade de traduzir conceitos complexos em uma linguagem acessível. Isso melhora a colaboração entre equipes e garante que as decisões tomadas sejam compreendidas por todos os envolvidos no projeto.
“É importante saber se comunicar na linguagem que pessoas de outras áreas entendem. Provavelmente há um motivo pelo qual você já está pensando na implementação, mas a maioria das pessoas não vai entender. Você precisa traduzir isso de forma acessível”, alerta Lucas.
A clareza na comunicação não apenas evita mal-entendidos, mas também fortalece o relacionamento entre times. Um Product Engineer que se comunica bem consegue influenciar melhor as decisões estratégicas e garantir que suas sugestões sejam ouvidas e implementadas com mais facilidade.
O futuro do Product Engineer
Nos últimos anos, temos visto um aumento no uso do termo Product Engineer. Mas será que esse título será amplamente adotado pelas empresas? Para Lucas, a nomenclatura importa pouco.
O crescimento desse conceito reflete a necessidade de profissionais que entendam tanto a tecnologia quanto o impacto do produto. Independentemente do título, o que realmente importa é a abordagem adotada no dia a dia do trabalho.
“Meu título de Product Engineer só começou quando entrei na PostHog em dezembro do ano passado. Mas, na minha opinião, todo engenheiro de software sênior já é um Product Engineer, especialmente em empresas grandes. A diferença maior acontece quando se trata de infraestrutura, onde temos os Platform Engineers.”
Com a crescente complexidade dos produtos digitais e a necessidade de alinhar tecnologia e estratégia de negócio, é provável que mais empresas passem a valorizar essa mentalidade. O importante é que as pessoas desenvolvedoras estejam preparadas para essa mudança, independentemente do nome do cargo que ocupam.
Conclusão
Adotar a mentalidade de um Product Engineer não significa abandonar a parte técnica do desenvolvimento de software, mas sim ampliá-la. Significa entender o impacto do trabalho além do código, alinhar as decisões técnicas com os objetivos do negócio e se tornar um profissional mais estratégico.
As pessoas desenvolvedoras que conseguirem equilibrar habilidades técnicas com visão de produto terão carreiras mais impactantes e versáteis. Afinal, no final do dia, o que realmente importa é resolver problemas e agregar valor para os usuários e para a empresa.
Se você é uma pessoa desenvolvedora e quer se destacar no mercado, considere ampliar sua visão para além do código. Afinal, todo mundo deveria ser um pouco Product Engineer.
Muito obrigado ao Lucas Faria que trouxe as suas experiências para contribuir com esse artigo!